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Viver sem Culpa: de Olho no nosso General Interno

Viver sem Culpa: de Olho no nosso General Interno

Eu não sou homem, não sou racional.

Não sou forte, corajosa, competitiva, agressiva.

Eu sou mulher. Sou sensível, emocional, intuitiva.

O mundo tem uma tendência de nos dividir assim, binariamente: homens são de um jeito e mulheres são de outro.
E não tem muito jeito.

Também dividiu as condutas em dois olhares: o certo e o errado.

Quem não se encaixasse nos modelos ditados pela cultura socialmente construída, frequentemente é considerado errado.
Consequentemente culpado.

E finalmente condenado ao sofrimento emocional.

Não só no mundo real, mas no nosso mundo interno, imaginário, essas regras funcionam mais fortes do que gostaríamos.

Tentamos buscar o que o nosso mundo exterior aplaude, corresponder a estes padrões (sócio- construídos) esmagando nossa singularidade.
Como se fosse possível “um certo” único para pessoas diferentes, para características diferentes, para escolhas diferentes, para homens e mulheres.
E quando não conseguimos correspondemos ao mundo externo, o que acontece?
Aparece ela.
Um dos sentimentos mais arraigados: A CULPA.

Telma Lenzi - Viver sem Culpa

Temos culpa de quê, mesmo?

No final não sabemos se estamos tentando cumprir o que foi pedido pelo mundo externo, pela interação com nossos pais, ou com o nosso projeto de ser pessoa no mundo construído por volta dos 6, 7 anos de idade.

E quando o cobrador já vive dentro de nós?

Nosso self não é único.
Somos muitos dentro de nós mesmos.
E dentro do meu self mora um personagem especial: O General.

Você também tem um General, aí dentro, nos seus diálogos internos?

Frequentemente o nosso mundo, a cultura, aplaude as ações dos nossos Generais Internos: regras, disciplina, busca de aprimoramento, solidez, determinação a todo custo.
Ainda mais quando ele age fortemente em uma mulher.

Mulheres do nosso tempo: fortes, determinadas, obstinadas, combativas, corajosas, práticas e rápidas.

Qual o custo emocional de vivermos através de apenas um Personagem Interno: auto abandono, desconhecimento de si próprio, vazio existencial, doenças físicas, doenças emocionais.

Como acontece esta construção?

Em algum momento de nossa vida, talvez na infância criamos o nosso General.
Ele pode ter vários outros nomes: cobrador, gladiador, sargento, patrão /patroa.
Não importa. Todos estão designados para a mesma tarefa.

Telma Lenzi - Viver sem Culpa

O General está à nosso serviço com a missão de nos proteger e zelar a todo custo para que nosso “Projeto de ser pessoa realizada e feliz no mundo” aconteça.

Criamos este projeto na infância, e esquecemos de fazer atualizações durante a vida adulta.

O que desejamos para nossa vida, ao olhar para o mundo com os olhos de uma criança?

Desejamos aceitação por nossa família. Amados, cuidados para conseguirmos sobreviver física e emocionalmente.

Condições do “Projeto de ser pessoa realizada e feliz no mundo”:

Ser boazinha, ser perfeita, obedecer às regras impostas, tirar excelentes notas na escola, ceder, evitar conflitos na família, não errar.

Diante da necessidade e da dificuldade de executar tais condições, o General Interno assume o comando.

Dentre as muitas tarefas do General Interno, a maior é ser nossa voz interna de censura que nos dirá o certo e o errado de cada contexto.
Ele tem um itinerário, um jeito próprio para resolver conflitos.
Cuidará do que significamos como vital, importante, essencial para construirmos o “Projeto de ser pessoa realizada e feliz no mundo”.
A todo custo, ao pé da letra, vai evitar nosso sofrimento.

Muitas vezes, para evitar uma dor maior, causa outros danos.
Para evitar a rejeição, nos leva a calar nossos desejos e opiniões.
Para evitar o abandono, nos ensina o auto abandono.
Para buscar o cuidado, nos ensina a cuidar do outro e não expor nossa fragilidade.

Internamente, em nossos diálogos com ele – O General – agimos da mesma forma: calamos, abandonamos nossos desejos e não o atualizamos.

Não questionamos a diferença entre o risco e a possibilidade.

O General fica sem nosso direcionamento, segue com autonomia interna na luta para que possamos atingir a perfeição.
Vai continuar a cuidar do projeto inicial, controlar, oprimir, brigar, gritar, punir e gerar culpa. Muita culpa.

VIVER COM CULPA

A Culpa é um sentimento que mora na nossa ansiedade do futuro, nas tristezas, insatisfações e frustrações do passado.
Hábil em criar espaços de tédio, angústia e depreciação.

A Culpa é a dor e a distância entre o que nós fomos e a narrativa opressora de como nós deveríamos ter sido.

Telma Lenzi - Viver sem Culpa

Dentro de nosso self há um eterno julgamento, onde o General é o Juiz que nos coloca como Réu e cria uma ruptura interna: de um lado a pessoa real, imperfeita, errada, ruim.
Do outro a pessoa idealizada, perfeitamente certa.

Exige algo impossível em nossa condição de humanidade e o conflito interno se instala: seguimos buscando a perfeição, a ausência de erro para aliviar a tensão, inicialmente com o mundo, depois com nosso mundo interno.

E quanto mais esforço fazemos, mais nos distanciamos do que queríamos:  “Projeto de ser pessoa realizada e feliz no mundo”.

Calamos outras vozes internas, outros personagens internos que pedem respeito, liberdade, espaço para existir.
Aprendemos a viver com a CULPA.

Afinal, buscamos a auto realização ou a realização de uma idealização de como deveríamos ser?

Quanto maior for a expectativa a nosso respeito, quanto maior for o modelo perfeccionista de como deve ser a nossa vida, maior será o nosso sentimento de Culpa.
E o General vai usar do seu jogo da tortura, da pressão, da autopunição, da culpa, para cumprir a nossas idealizações ingênuas.

O General, através da culpa, traz a narrativa do auto-aperfeiçoamento como garantia de mudança.

Mas a Culpa não possibilita crescimento. Incapacita-nos de lidar com o erro.
Gera uma lamentação interior por aquilo que já ocorreu, ao invés de olhar para novas possibilidades futuras.

A culpa vem por sermos imperfeitos.
A culpa vem por não sermos infalíveis.
Carrega um profundo sentimento de onipotência e frustração.

Telma Lenzi - Viver sem Culpa

A culpa é um auto-desprezo, um auto-desrespeito pela natureza humana, nos seus limites e na sua fragilidade.

A culpa é uma vingança de nós mesmos por não termos atendido a expectativa de alguém a nosso respeito, seja esta expectativa clara e explícita, ou uma expectativa interiorizada pela cultura no decorrer da nossa vida.

A culpa nos empurra para o contato direto com nossa humanidade, em um dolorido confronto com nossas mais remotas e ingênuas intenções perfeccionistas.

Tais intenções perfeccionistas idealizadas, crenças irreais, limitadoras ou desatualizadas, construíram uma narrativa dominante, uma missão aniquiladora que delegamos aos cuidados do nosso General Interno.

Quais verdades desatualizadas, ingênuas, impossíveis de serem atingidas, ainda cremos e, por isso, nos causa danos:

1. A crença da possibilidade da perfeição

Quem procurar na vida a perfeição encontrará e viverá atormentado pela culpa.

A expectativa perfeccionista da vida é uma construção da nossa idealização, é um conceito alienado de que é possível viver sem cometer erros.

Quanto maior for a distância entre a realidade objetiva e as nossas idealizações, maior a culpa.
Quanto maior for o espaço entre aquilo que podemos nos tornar, através do nosso verdadeiro potencial e as construções idealistas impostas, maior a culpa.
Quanto maior a culpa, tanto maior será o nosso esforço na vida e maior a nossa frustração.

Nos relacionamos e dialogamos com esta crença opressora da perfeição, vivendo com o comando de um Personagem Interno (General) que não se fundamenta nas nossas necessidades reais.

E o General torna-se um inimigo dentro de nós, para manter o ideal imaginário de como deveríamos ser e não de como realmente somos.
Esquecendo o sentido maior de errar, esquecendo nossas humanidades.

Aceitamos que perfeição não existe, mas continuamos a nos torturar e a torturar e a punir os outros por não corresponderem a um ideal perfeccionista do qual não querem abrir mão.

Telma Lenzi - Viver sem Culpa

2. A crença de que é errado errar

Às vezes acreditamos que não pode haver erro e que a culpa é uma decorrência natural do erro cometido. Havendo erro, deve haver culpa.
Ao acreditamos nesta crença, criamos um estado de tensão permanente:
Vamos passar a vida inteira tentando não errar para não sentirmos culpa.
Ou então passaremos a vida inteira nos sentindo culpados porque sempre erramos.

A culpa não decorre do erro, mas da nossa narrativa diante do erro.

Uma coisa é o erro, outra coisa é a culpa. São lugares diferentes.

O que chamamos de erro é a saída fora de um modelo cultural pré-determinado, que pode ser errado hoje e não amanhã, pode ser errado num contexto e não ser errado em outro.
A culpa é uma crença de que é errado errar.

A culpa é a crença de que devemos ser castigados pelas faltas cometidas, por cada erro deve haver um castigo, uma punição.

Não é possível não errar, o erro é inerente à natureza humana, ele é necessário a nossa vida. Só crescemos através do erro.

Na perfeição humana está incluída a imperfeição.

Assumir o erro é diferente de sentir culpa.
Assumir o erro é aceitar que erramos, e nos responsabilizarmos pelo que fizemos ou deixamos de fazer.
Acreditar que a culpa decorre do nosso erro, vai mobilizar que busquemos responsabilizar o outro, o mundo, pelos nossos erros, numa tentativa de acabar com a nossa culpa.

Quando cometemos um erro, acontece o encontro com o imprevisível, o inesperado.
Se tudo acontecesse como planejamos, jamais experimentaríamos o novo. Jamais ampliaríamos nossa criatividade e nosso potencial.

A vida seria uma repetição de caminhos conhecidos já vividos e explorados.
Podemos mais que isso escolhendo viver com responsabilidade.
Podemos viver sem culpa.

VIVER SEM CULPA

Podemos avançar em relação a esta construção de liberdade interior.

Precisamos chamar nosso General Interno para uma conversa e:

• Atualizá-lo de qual é hoje o nosso “Projeto de ser pessoa realizada e feliz no mundo” e qual o seu papel.
• Transformar qualquer tipo de embate ou oposição em diálogos transformadores.
• Reestabelecer a gentileza como essencial em seu discurso.
• Construir um espaço interno dialógico multivocal, ressignificando a dualidade polarizada certo/errado.
• Convidá-lo para assistir esta palestra sobre VIVER SEM CULPA.

Viver sem culpa é aceitar quem se é.
Viver sem culpa é transformar a vergonha do erro em auto aceitação.

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É o espaço entre o errar e o tentar novamente.

É o espaço entre o tombo e o levantar, para continuar o que estávamos fazendo.

É aceitar nossa imperfeição, nossa própria humanidade.

É aceitar nossas limitações.

Aceitar que não somos onipotentes, nem onipresentes.

Aceitar que não somos rápidos ou que somos rápidos. Às vezes muito, às vezes pouco.

Cada um sabe o que precisa aceitar em si.
E na proposta de auto aceitação, a aceitação dos outros vem de carona.
Virá quando conseguirmos nos aceitar como somos.

A auto aceitação é restabelecer a nossa própria unidade, a nossa inteireza diante da vida, é unir outra vez o que a culpa dividiu, é uma aceitação integral daquilo que já aconteceu, que já passou, que já não tem jeito. É aceitar perder o que já está perdido.

É o encontro corajoso e amoroso com a realidade. Um sim ao presente, a renovação da auto amor e do bem estar.

Auto aceitação é um sim a nossa natureza humana múltipla, às nossas várias vozes internas e ao diálogo gentil, colaborativo e transformador entre ela.

VIVER SEM CULPA É UM MODELO DE PAZ.

 

Telma Lenzi | Dezembro 2014

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